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Desvendado mistério com mais de meio século na atmosfera de Vénus
2015 março 02

A onda Y na atmosfera de Vénus. Créditos: Peralta et al. 2015Evolução temporal da onda Y na atmosfera de Vénus. Créditos: Peralta et al. 2015

Pela primeira vez em mais de 50 anos, uma equipa internacional, da qual fazem parte os investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA1) Pedro Machado e David Luz, desvendou o mistério da nuvem “Y” de Vénus, descrevendo o mecanismo que a suporta e reproduzindo, de forma inédita, a sua evolução temporal.

O planeta Vénus está coberto por uma densa camada de nuvens sem quaisquer características distintivas. Porém, quando observado no ultravioleta, apresenta estruturas escuras impressionantes. A origem da maior destas estruturas, que cobre quase todo o disco do planeta e tem a forma de "Y", tem sido um mistério desde a sua descoberta há mais de cinco décadas. No início, os astrónomos pensavam que o Y era apenas um aglomerado de nuvens arrastadas pelo vento, mas em 1973, os dados da missão Mariner 10 (NASA) revelaram que a estrutura não só se propaga como um todo, como fá-lo a uma velocidade diferente do meio envolvente.

De acordo com Pedro Machado (IA e Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) “Este estudo permitiu levantar o véu de um mistério que persiste há muito tempo sobre a atmosfera de Vénus, o que nos deixou muito entusiasmados. Concluímos que a estrutura observada é na realidade uma onda à escala planetária. Contudo, a princípio não sabíamos de que tipo de fenómeno ondulatório se tratava, visto não se enquadrar em nenhum dos casos conhecidos".

Estas estruturas escuras revelaram a presença de grandes quantidades de um composto ainda desconhecido, que absorve a radiação ultravioleta e obscurece essas regiões. As observações destas estruturas permitiram ainda inferir a característica de “super-rotação” da atmosfera de Vénus - enquanto o planeta demora 243 dias para girar sobre si mesmo, a atmosfera dá uma volta em torno do planeta a cada quatro dias.

"Uma onda do tamanho da Y deve desempenhar um papel-chave para explicar porque é que a atmosfera roda sessenta vezes mais rápido do que a superfície, de modo que compreender essa estrutura é crucial", afirma Javier Peralta, investigador do Instituto de Astrofísica de Andalucía (IAA-CSIC) e responsável por este estudo2,3, em destaque na revista Science e escolhido como capa da Geophysical Research Letters.

Os investigadores deduziram uma nova onda atmosférica compatível com a rotação extremamente lenta de Vénus e que explica, com uma simplicidade surpreendente, muitas das características observadas na onda Y.

Esta onda não está confinada somente à região equatorial, mas também está limitada às altitudes onde os ventos atingem a sua intensidade máxima, o que explica porque a Y só se observa no topo das nuvens de Vénus.

O resultado mais surpreendente deste estudo foi verificar que a forma de "Y" é devida à distorção que os ventos produzem nesta onda. "O vento forte que sopra para o oeste em Vénus é aproximadamente constante entre o Equador e as latitudes médias. Contudo, como em latitudes altas o raio do paralelo do lugar é menor, os ventos completam uma volta ao planeta mais rapidamente do que no Equador, de modo que a onda vai sendo distorcida - explica Javier Peralta. Foi emocionante ver como essa nova onda de escala planetária toma a forma de um "Y", à medida que os ventos venusianos a distorcem".

Notas

  1. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), é a maior unidade de investigação na área das Ciências do Espaço em Portugal, englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) encomendou à European Science Foundation (ESF).
  2. Este estudo foi publicado no artigo “Venus's major cloud feature as an equatorially trapped wave distorted by the wind” na revista Geophysical Research Letters.
  3. A equipa envolvida neste estudo conta com a participação de membros do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), do Instituto de Astrofísica de Andalucía (IAA-CSIC) e do Grupo de Ciências Planetárias da Universidad del País Vasco (UPV/EHU).

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