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A imagem nunca antes vista
2019 abril 10

A primeira imagem de um buraco negro super-massivo. Créditos: EHT CollaborationHugo Messias, membro do Observatório ALMA e colaborador do IA.O radiotelescópio Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA). Créditos: A. Marinkovic/X-Cam/ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)
A primeira imagem direta de um buraco negro foi divulgada hoje, em sete conferências de imprensa simultâneas, pela iniciativa internacional Event Horizon Telescope (EHT). Esta é uma colaboração entre oito radiotelescópios espalhados pelo mundo e com um objetivo comum: criar um telescópio virtual do tamanho do planeta Terra capaz de observar a vizinhança imediata de um buraco negro super-massivo1. O objetivo foi alcançado e neste resultado histórico participou Hugo Messias, membro do observatório ALMA, um dos telescópios envolvidos no projeto EHT, e colaborador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA2), do qual foi investigador integrado até agosto de 2016.

Observações simultâneas realizadas em abril de 2017 a partir de oito radiotelescópios tão distantes como Havai, Espanha ou Antártida, e cujos dados foram analisados durante dois anos, permitiram reconstituir a primeira imagem da silhueta de luz em torno de um buraco negro com 6,5 mil milhões de vezes a massa do Sol. Este monstro cósmico encontra-se a 55 milhões de anos-luz da Terra no âmago da maior galáxia do enxame de galáxias da Virgem, designada Messier 87. Esta é a primeira vez que é possível ver o chamado horizonte de acontecimentos3, o limiar daquilo que é possível fisicamente observar de um buraco negro.

Recentemente assistimos a mais um sucesso das previsões da relatividade geral de Einstein através da deteção de ondas gravitacionais emitidas pela colisão de buracos negros”, diz Hugo Messias. “Agora, estes resultados do projeto EHT comprovam-no a uma escala 300 milhões de vezes maior, nas condições de gravidade extrema perto de buracos negros super-massivos.

Desde janeiro de 2017 que Hugo Messias tem estado envolvido nestas observações através do radiotelescópio ALMA4, o maior observatório no conjunto das oito estações que constituem o Event Horizon Telescope, funcionando como a estação de referência. Ajudou no teste do sistema que permite ao ALMA trabalhar como uma só antena virtual de 73 metros de diâmetro, e participou também na preparação e execução das observações, assim como no tratamento e verificação dos dados.

São oito estações espalhadas pelo mundo, nos dois hemisférios. Quando começam as observações, temos de estar todos a apontar para um mesmo ponto no céu e coordenados à fração de segundo”, comenta Hugo Messias. “Apesar das diferenças culturais, esta equipa tinha um objetivo comum e conseguiu alcançá-lo! Esta é também uma grande lição.”

O Event Horizon Telescope tem ainda como alvo o buraco negro no centro da nossa própria galáxia, designado por Sagittarius A*, responsável por intensas emissões no rádio e nos raios X. De massa 1500 vezes menor do que aquele que existe na Messier 87, o material que o rodeia orbita por isso muito mais rapidamente. Esta variabilidade faz com que seja mais difícil e moroso obter uma imagem com a mesma qualidade desta divulgada hoje.

A comunidade astronómica internacional aguarda agora com expectativa a publicação dos resultados das observações realizadas em 2018. Estes poderão trazer luz sobre o Sagittarius A*, assim como mostrar a evolução temporal deste seu congénere na galáxia Messier 87.

Este é um resultado considerado por muitos impossível, até hoje”, comenta José Afonso, coordenador do IA e investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). “Observar diretamente um buraco negro é mais uma prova do engenho humano e da capacidade tecnológica hoje em Astronomia. Abrem-se agora novos campos de investigação para percebermos o que são os buracos negros, e como eles são importantes para compreender a evolução das galáxias e, portanto, a história do próprio Universo. É ainda um enorme prazer que este fantástico resultado tenha uma presença portuguesa, através de um investigador formado no IA.


Notas
  1. Os buracos negros são locais do Universo onde uma enorme quantidade de matéria se encontra concentrada numa região tão compacta que gera um campo gravitacional capas de reter a própria luz. Os buracos negros super-massivos que se acredita existirem no centro da maioria das galáxias, incluindo a nossa Via Láctea, deformam profundamente o espaço-tempo à sua volta e submetem o material envolvente a condições extremas de velocidade e temperatura.
  2. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a maior unidade de investigação na área das Ciências do Espaço em Portugal, integrando investigadores da Universidade do Porto e da Universidade de Lisboa, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) encomendou à European Science Foundation (ESF). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UID/FIS/04434/2019).
  3. O horizonte de acontecimentos é a superfície em torno de um buraco negro para além da qual quaisquer acontecimentos não poderão afetar o que se passa fora dessa superfície. Tal deve-se ao facto de nada, nem a própria luz, uma vez aí dentro, conseguir escapar para o exterior.
  4. O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) é um radiotelescópio constituído por 66 antenas localizadas a 5000 metros de altitude no deserto do Atacama, no Chile. É atualmente o maior radiotelescópio do mundo. O IA é o Centro de Competências Português para o ALMA (PACE), ajudando a validar os dados deste observatório, tendo Hugo Messias participado na criação deste centro.

Contactos

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